(amigos)

Virar a cabeça
não é resguardar

(amigos)

nem ver as pessoas
é vistoriar

Sedenta é aquela
que olha uma montra
no fundo dos olhos
reparem
está morta

os outros passeiam
com ar de enganados

verdade há naquele
com a fome
no fato

Virar a cabeça
não é reparar

(amigos)

nem ver as pessoas
é vistoriar

O Chão tem os
anos
e a área dos meses

e a morte é um
fruto com raiva nos dentes

Reparem
no choro que nos deram
no berço

verdade é a História
com arado
e semente

Virar a cabeça
não é confrontar

(amigos)

nem ver as pessoas
é vistoriar

Tem o povo as mãos
pregadas na terra

Se um dia as recolhe
são armas de guerra

que o pão é
feitio que o corpo
aí toma

a verdade é no peito
uma bala sem lógica

Virar a cabeça
não é perguntar

(amigos)

nem ver as pessoas
é vistoriar

Dobrada lava a mulher
o chão
de toda uma casa

que os braços
não lavram milho
quando as espigas estão quebradas

questão de vício
ou vencer

questão de força

Reparem

há um clima
de raiva
com armas que não disparam

Virar a cabeça
não é transformar

(amigos)

nem ver as pessoas
é vistoriar

Maria Teresa Horta, in “Cronista não é recado” (1967)